Passados dois meses e quase meio da defesa, eis que está disponível no LUME (sistema de biblioteca da UFRGS) a versão da tese entregue para a biblioteca e que será, definitivamente, a prova cabal de que defendi a tese e posso ser considerado um “doutor” pelos sistemas acadêmicos. Boa parte do material que usei, assim como alguns fichamentos, está disponível nesta página também. Passado esse tempo, já vejo o trabalho com outros olhos. Ainda olhos viciados, mas menos do que antes, com um início de distanciamento do processo que já me faz ver com melhor nitidez os defeitos e as qualidades da tese.
Ajudou a ter esse olhar, também, duas ocasiões em que estive falando do trabalho na Unisinos, a primeira na aula de Ronaldo Henn e Maria Clara Aquino Bittencourt na pós-graduação (a foto que abre o post é de lá, feita pelo Ronaldo Henn), uma semana depois da defesa; a segunda no VI Seminário Aberto de Jornalismo da mesma pós, numa mesa a debater “Práticas e Novos Modelos de Jornalismo Digital” com Leandro Demori (Medium/Piauí) e Daniela Bertocchi. Uma parte de minha fala foi transmitida ao vivo via Facebook, e um relato de Ronaldo resumindo o evento inteiro foi publicado no Medium.
Um sentimento muito presente pós-defesa é o de um certo alívio, oriundo do clichê “missão cumprida”. Outro, talvez mais meu do que de muitos recém-doutores, é o cansaço da academia: do sistema hierárquico, da cobrança de produtividade sem relevância, do diálogo às vezes viciado de formalidades que revelam mais falsidade do que honestidade. Felizmente, nas duas ocasiões na Unisinos, o diálogo foi produtivo e sincero, mas ainda estou num processo de afastamento desse universo e (re) aproximação de outros mais práticos. Busca pessoal mesmo, de ir para outras frentes que me interessam mais e que, por motivos tortos, nunca entraram na linha de frente de minha vida acadêmica.
Aos que aqui me acompanham, convido também a visitar o BaixaCultura, que está sendo reformulado para virar um laboratório online de cultura livre e (contra) cultura digital. Não é uma novidade em si, já que o Baixa vem sendo esse espaço experimental que caracteriza um laboratório já faz uns bons anos, mas agora isso vai estar mais explícito. E também o Enfrenta, projeto de mapeamento de coletivos espanhóis que participei em janeiro e fevereiro deste ano – quando a tese estava sendo revisada, aliás – e que, nestes meados de 2017, está em sua 2º etapa, de realização dos produtos da pesquisa. Com esses dois projetos e outros embrionários, busco criar caminhos, bem como fortalecer os já existentes, que me tragam algumas respostas sobre a viabilidade (“sustentabilidade”) de modos de vida alternativos, uma busca de autonomia guiada pelas ideias da cultura livre e da economia solidária. Também é um teste de criação de caminho para buscar uma resposta bem particular: quais são as possibilidades de ser um “doutor” sem ser professor em tempo integral numa universidade, pública ou particular, tal como conhecemos a universidade hoje? É viável, em termos de sobrevivência financeira, ensinar e aprender com profundidade em sistemas que fujam do tradicional instituído na academia, mesmo que em alguns pontos não deixem de dialogar com ela?
Algumas pessoas tem dito e mostrado que sim, outras tem investigado bastante sobre isso (veja o Lab21), e eu tenho tentando entender um pouco melhor como se dão estes projetos, de doutorados informais à Escola da Ponte (veja essa entrevista com José Pacheco, um dos criadores da Escola), da Nuvem ao laboratórios de inovação cidadã (como o brasileiro LabxSantista, criado pelo Instituto Procomum). Como disse num post anterior, com a catástrofe ambiental sendo cada vez mais uma realidade, com a “Intrusão de Gaia” (termo de Isabelle Stangers) nos fazendo perder todas as referências e com a chegada do Antropoceno, essa era geoológica que só deverá dar lugar a uma outra muito depois de termos desaparecido da face da terra, como diz Eduardo Viveiros de Castro e Déborah Danowski (em “Há Mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins”, 2014), entendo também a busca de espaços de aprendizagem alternativos aos que existem hoje como fundamental para nossa sobrevivência enquanto espécie neste planeta.
Não perco totalmente a relação com a universidade porque acredito que haja uma possibilidade (pequena) de hackear ela por dentro. E, também, ainda dou aulas esporádicas de narrativas jornalísticas digitais em duas especializações, na UCS e na PUCRS, e nesta última começo no semestre que vem uma disciplina chamada “cultura hacker e jornalismo digital” que quero que seja um experimento de uma educação mais próxima à iniciativas que listo acima. Reconheço a Universidade como, mais do que produtora, um espaço de normatização e legitimação sistêmica do conhecimento, e o contato com ela é importante. Mas é certo que há muita vida e coisas a fazer também fora da universidade, não é mesmo?