Dias Perfeitos

perfect days

Faz duas semanas que vi “Dias Perfeitos”, do Wim Wenders (até hoje provavelmente o cineasta que vi mais filmes na vida) e ainda tenho me pego pensando nele – ajudado também pela playlist com as músicas das fitas de Hirayama (o protagonista) expandida um tanto para um rock psicodélico japonês que me fez descobrir a maravilhosa Sachiko Kanenobu (a “Joni Mitchell japonesa”, numa redução ruim mas que talvez ajude). Não é um filme onde coisas explodem, nem há reviravoltas malucas nem cenas chocantes; há a rotina mostrada numa existência ritualizada, onde os prazeres e os momentos de lazer se encaixam numa dinâmica geral e programada. Um eterno retorno do mesmo: dos mesmos horários, dos mesmos gestos, dos mesmos lugares, do mesmo trajeto, com sutis diferenças criadas pelo destino – o inesperado da diferença que sempre se apresenta.

A existência de Hirayama é marcada pela simplicidade (alguns diriam também “pobreza”), onde a felicidade se torna possível, descomplicada e discreta – o que não significa que não exista dor, trauma e sofrimento, já que há tb muita coisa escondida nessa rotina que não acessamos por completo. Algo muito bonito que ficou disso tudo pra mim é que Hirayama parece ter um certo “compromisso com um modo de existência”, uma definição de ética que está em Deleuze (que, por sua vez, buscou em Espinosa). O pouco que acessamos de sua vida fora dos “Dias Perfeitos” é uma sugestão sutil de que este modo de vida é um compromisso consigo, uma diferenciação com relação àquilo que esperam dele, talvez uma recusa em repetir os gestos da família, ou um desejo mais forte de tornar-se o que se é, com o mínimo, ou o máximo, de autoria e singularidade.

Memórias aleatórias de domingos #1

wenders

Em 2010, recém chegado a São Paulo, entrei pela 1º vez no MASP pra ver “Lugares, estranhos e quietos”, uma exposição de fotografias de Wim Wenders. Aquelas 23 fotografias de lugares vazios ao redor do mundo me despertaram alguma coisa que até hoje não sei bem o quê. Fui atrás do catálogo, publicado pela Imprensa Oficial de SP, em várias livrarias e lojas da cidade. Não achei.

Em janeiro de 2014, em Berlim, fui visitar o Museum für Fotografie, Helmut Newton Foundation, um lugar que tinha achado bonito quando vi do metrô chegando na cidade, umas semanas antes. Não consegui ir no espaço da exposições, mas na loja do museu achei “Places, strange and quiet“, livro de Wenders com as fotografias de exposição. Gastei a grana de um dia inteiro de comida e hospedagem, mas comprei.

Em maio de 2015, a Sala Redenção, em Porto Alegre, fez uma Mostra Wim Wenders com mais de 20 filmes, novos e antigos. Na noite de uma segunda-feira chuvosa e fria de maio, vi “No Decurso do Tempo” (“Kings of The Road, Im Lauf der Zeit”, 1975), filme da “trilogia da estrada” do alemão que traz a história de um técnico de projeção de cinema e um homem recém-separado viajando pela Alemanha num caminhão. 3h em p&b com poucos e bons diálogos, muitas paisagens da Alemanha, música, introspecção: um filme impressionante.

Hoje fui buscar algum filme pra ver/baixar: achei “Alice nas cidades” (1974), o primeiro dessa trilogia, que ainda não tinha visto (gracias, internet) e uma coletânea em 4 discos das músicas tocadas (e/ou regravadas) nos filmes: “Wim’s – Driven By Music”.

Ainda não consigo entender direito o que as fotos, os filmes e estas músicas me despertam, mas.

A foto de abertura é do interior da Armênia, 2007, capa do livro citado; as outras abaixo também são do livro.

18 de setembro de 2016, Facebook

Wim Wenders: Sun Bather, Palermo, 2007 c-print 132 x 148 cm © Wim Wenders. Courtesy Haunch of Venison.

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